CAMINHOS DE PAPEL

quinta-feira, janeiro 18, 2007

ELES ESTÃO INDO EMBORA


De vez em quando, passo aqui pelo meu blog para desabafar contra o estado de coisas que tem envolvido nossa pátria mãe gentil. Está ficando redundante chutar sempre o mesmo balde e encontrar ressonância zero em quem de direito. Afinal, políticos continuam politicando, estradas (e ruas) continuam afundando, corruptos continuam corrompendo e bandidos continuam andando por aí, sem lenço e sem documento, mas com um fuzil AR-15 nas mãos.
Já que é assim resolvi mudar o foco destas linhas depois de ter assistido, ontem à noite, ao show do SESC Vila Mariana, onde Paulo Vanzolini foi homenageado e muito bem interpretado pelas cantoras Márcia e Ana Bernardo, esta, filha de Arthur Bernardo, um dos fundadores dos Demônios da Garoa.
Eu iria chover no molhado se começasse a falar da genialidade do homenageado que, com sua indefectível cervejinha na mão e sentado à mesa, contribuiu com tiradas de humor e inteligência.
Vanzolini, como se sabe, tem oitenta e três anos de idade e, gostemos ou não, aproxima-se do fim de um ciclo no qual soube se valorizar e cultivar valores muito caros a ele e a todos nós.
Isso me levou a refletir sobre o fato de que muitos artistas de seu nível, mas nas mais diversas atividades do nosso cotidiano, também irão embora algum dia. O mais preocupante, entretanto, é que essa matéria prima não está sendo reposta com a mesma velocidade em que se vai. Pelo contrário, proliferam exemplos de mau gosto, ignorância e falta de educação.
Tudo bem. Nem os antigos mestres da música clássica escaparam, algum dia, de produzirem uma obra menor, não coadunante com sua genialidade. O problema é que, nos dias de hoje, obras menores é que não faltam. E bota menor nisso.
Os grandes empresários (sem ter nada de grande) visualizam uma potencial estrela (leia-se, mina de ouro) e jogam todas suas fichas nela, apoiados por uma mídia estupidificante onde o lucro é a meta dessa empreitada. Ligamos a TV e deparamos com deprimentes programas de auditório, onde a deusa Euterpe é massacrada por pagodeiros e loiras rebolantes, por bondes de funkeiros ou por novos hillbillies, caipiras que nunca pisaram o barro, a não ser o de suas fazendas compradas graças a seus CD’s.
Se isso tudo existe, é porque há ressonância no mercado. A população caminha bovinamente, sendo dopada cada vez mais e não só relativamente ao meio artístico-cultural. Em todos os aspectos da vida cotidiana nota-se o aprofundamento da anestesia que estão nos aplicando e que, seguramente, resulta no comportamento da coletividade.
O sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu recentemente, num artigo na Folha de São Paulo, que a perda de valores religiosos e tradicionais, por não serem substituídos por valores humanistas e cívicos, está tornando a sociedade brasileira uma das mais destituídas de ética do mundo. Impera, da cúpula à base, o espírito da malandragem.
O que escrevi acima, é apenas um dos aspectos da gigantesca fratura que está ameaçando tombar a nossa sociedade para dentro de um fosso de onde dificilmente se reerguerá. Se conseguir fazê-lo, contudo, será às custas de muito mais sacrifício do que se necessitaria, agora, para deter essa avalanche de mediocridade que nos assola.
Resta saber se nós queremos reagir. Está me parecendo que a tática da acomodação ganha mais espaço a cada dia.
Os mestres estão mesmo indo embora. Pudera, o que poderiam eles fazer quando se liga a TV e damos de cara com o Caldeirão do Hulk anunciando um CD intitulado Pancadão?

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