CAMINHOS DE PAPEL

domingo, janeiro 31, 2010

POEIRA DO TEMPO

ESTA CRÔNICA FOI ESCRITA ANOS ATRÁS, NUMA DE MINHAS PRIMEIRAS VISITAS À SÃO LUÍS DO PARAITINGA.  NESSA OCASIÃO, OS ESTADOS UNIDOS DEFLAGRAVAM A OPERAÇÃO "TEMPESTADE NO DESERTO",  INVADINDO O IRAQUE E IMPONDO A SUA "PAX ROMANA" DE ENFIAR A DEMOCRACIA PELA GOELA ABAIXO DE QUE OS DESAFIASSEM.

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Mal entrando na cidade e ainda com o carro sacolejando nas ruas com calçamento de pedra de São Luís do Paraitinga, passei a observar o casario antigo daquela que, um dia, foi chamada por D. Pedro II, de cidade-presépio.

Estacionei o carro na rua principal e fui andando por ali, apenas olhando. Os antigos sobrados estão bem conservados; são o orgulho da cidade, assim como suas festas. Fazendo contraponto ao dia cinzento, as cores alegres dos prédios passavam uma impressão de bem-estar naquelas ruas estreitas, levando-me a esquecer as notícias frescas sobre o distante Iraque.

Como turista que se preza, saquei da câmera e comecei a fotografar. Um ou outro morador prestava um pouco mais de atenção em mim, viajante perdido num sábado pós-Carnaval. E era verdade; com um tempo prometendo chuva parecia haver raros forasteiros pisando nas solenes pedras que abrigam todos os anos movimentadas festas de Momo e a Festa do Divino Espírito Santo.

Vestígios da alegria recente ainda existiam. Perto de uma casa vi dois bonecões e não resisti em tirar uma foto. Da janela, um senhor olhou-me sério e curioso, mais isto que aquilo. Ao pedir-lhe licença para fotografá-los, abriu um vasto sorriso, concordando.

Após eu ter clicado, ele se aproximou para dois dedos de prosa, contando que aqueles bonecos haviam saído no carnaval recém-findo. Fizeram sucesso dançando as marchinhas tocadas nos três dias de Momo e eu fiquei sabendo só tocarem esse gênero de música nos desfiles carnavalescos, uma tradição local. Não escondeu seu entusiasmo ao falar da Festa do Divino, que em maio voltaria a alegrar a cidade. Proseamos por meia hora até eu retornar à bucólica praça onde alguns idosos jogavam dominó, tão alheios à minha pessoa e ao mundo, levando-me a pensar sobre o que saberiam eles sobre o resto do planeta. Tudo bem; não estavam isolados da civilização; era possível ver que muitas casas tinham uma antena parabólica sobre o telhado trazendo notícias de guerra num distante país de mil e uma negras noites.

Meu inesperado interlocutor de momentos antes, contudo, mostrara-me que o mais importante era mesmo o contato humano, pouco importando àquela gente que um simples apertar de botões vermelhos acabaria com o bucolismo que os cercava e com a guerra nas areias do deserto iraquiano.

O tempo voltou a fechar e uma fina garoa começou a umedecer as pedras lisas. Voltei ao carro e, saindo da cidade, dei uma última olhada pelo espelho retrovisor.

Lá atrás, perdida nos contrafortes da Serra do Mar, a cidadezinha aos poucos ia desaparecendo no meio da neblina, como se esta fosse uma tempestade de areia.

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Por uma dessas coisas que o destino não explica, em janeiro deste ano, parte da cidade foi arrasada pelas chuvas de verão.   O que se espera não é ajuda política como andam fazendo por aí.  A cidade e seus moradores querem seu patrimônio de volta.   Apenas isso.

1 Comentários:

  • Às 11:22 AM , Blogger Unknown disse...

    Boa Tarde, sou Amanda Galdino, estudante do quinto semestre de Jornalismo -Mackenzie.
    Tenho na aula de Criação de Texto um jornal chamado Diretriz, e estou escrevendo uma matéria sobre o trenzinho da Cantareira,vi você na comunidade contando sobre o trenzinho, será que poderia me dar algumas informações.
    Obrigada desde de já.

    Amanda Galdino

    manda_galdino24@hotmail.com

     

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