CAMINHOS DE PAPEL

quarta-feira, junho 10, 2009

REATIVANDO O BLOG (10/06/2009)


O texto abaixo foi publicado no jornal de bairro "Gazeta do Tatuapé", por alguem cujo nome nem vou citar - pois não merece aparecer - e o texto seguinte, foi uma resposta minha, publicada também nesse jornal:



"O MAIS CRUEL DOS MALES" (Edição de 23 de maio)

Sr. Redator:

"Aos moços, dou um conselho: não fiquem velhos. Verdade que as opções são poucas. Ou morrer ou lutar contra a velhice. E morrer não seria a melhor solução. E a luta sempre resulta em partida pertida e inglória.
Entre os processos da natureza, a velhice é o mais cruel; Implacável. Insidiosa, ataca por todos os lados e abre as portas para as moléstias mortais. É uma espécie de HIVa longo prazo. Ataca o coração, o pulmão e todas as demais vísceras. Não esqueçamos da fiação arterial e venosa, da coluna, sem falar na atividade cerebral e na osteoporose.
Os moços compadecidos, os quarentões assustados e os próprios velhos apelam para tudo e inventam essas bobagens de terceira idade, clubes e associações que trabalham contra o isolamento e tristeza. Ninguém acredita naquilo.
Você já viu um velho casal, vestido à moda dos anos 30, tentando dançar um tango? É patético, apesar de alguns considerarem docemente ridículo. Inventam várias teorias sobre a velhice. Ginástica, dieta, malhação, corrida, etc.
Veja a situação da bela mulher, rica, endeusada, ao se deparar com as primeiras rugas. E aquelas ruguinhas junto aos lábios? Dr. Pitanguy era mestre em disfarçar anomalias, porém o milagre é passageiro.
Não há milagre permanente. Esticam a pele e fazem um "peeling", que é uma raladura na cutis. Lindo, a princípio, mas efêmero. Com o tempo, já não há mais onde esconder as cicatrizes atrás das orelhas, ou no couro cabeludo, que aparado encurta, deixando a testa enorme, quase careca.
E os cabelos brancos? Eles são pintados, porém fogem do natural. Anatureza dá cor de fio em fio, cada um em sua tonalidade. Uns mais claros, outros mais escuros. O conjunto é uma obra inimitável, que profissional nenhum conseguirá obter. E, finalmente, se envelhece a cabeça, a inteligência, as idéias, a alma.
O velho tenta se equiparar às audácias dos jovens ou mesmo excedê-las, mas não se convence. Fica até ridículo. Suas idéias são fruto do seu tempo, do que acumulou. Isso pode ser camuflado, mas não modificado. As células cerebrais não se renovam como as demais, afirmam os entendidos. Até mesmo idéias de gênios mortos envelhecem. Vide Freud,Einstein etc. Dizem os moços, com veemência: "eu queria, quando chegar à sua idade, ter essa lucidez". Lucidêz? Afinal o que ele esperava? Que a gente já estivesse caduco? Que lástima".

Sendo assim, enviei a carta abaixo ao jornal, que a publicou na semana seguinte, em 24 de maio:

"CONFESSO QUE VIVI"

"Peço perdão a meus parentes, amigos, enfim, a todos que me conhecem. Ousei viver, assim como o fez Pablo Neruda, porém muito longe da ousadia a caracterizá-lo e que deixou marcas que jamais serão apagadas das lembranças a serem carregadas pela História.
Tenho 67 anos e ousei envelhecer. Tivesse eu lido, trinta ou quarenta anos atrás, as linhas que li na edição passada desta Gazeta, na página "O povo quer saber", intitulada "O mais cruel dos males", com certeza teria morrido em vida, pois segundo o que depreendi dessa leitura, avancei demais na minha ideia de viber em harmonia comigo mesmo, com aqueles que sempre me cercaram, e com o mundo.
Sou doente, posto que sou idoso. Toda minha experiência de vida não foi suficiente para me dar a perceber que insistia em procurar a morte lenta, aquele tipo de morte a que são condenados todos aquels que ousam encarar o tempo e sempre se adaptando a ele.
Aquela leitura me fez ver qye fui, e continuo sendo - já que isto é inerente à minha personalidade - um louco visionário (ou seria melhor dizer, um velho fora de seu tempo?), pois não acato as normas a que devem, segundo a leitura que fiz nesta página no domingo passado, se submeterem os assim chamados "velhos".
Será que devo me arrepender de frequentar academia, mesmo fazendo-o por orientação médica? Deveroa eu me sentir ridículo em fazer musculação, byke, body balance ou hidroginástica?
Nesse meio conheci outras pessoas, aumentei meu círculo de relacionamentos, tudo inadvertidamente, pois ainda não havia descoberto que há muito tempo eu deveria ter me acomodado num sofá, encarando os progra,as da tarde na TV e arruinando de vez minha coluna lombar.
Neste momento, me sinto ridículo por participa de clubes e associações que lutam contra o isolamento e a tristeza, pois só agora descobri que não é essa a diretriz que deveríamos nos impor. E eu que sempre acreditei nelas!
Danço tango mal-e-mal. Ainda assim, ousei dançar, caracterizado, juntamente com um grupo da extinta Oficina Cultural Raul Seixas, em plena praça Sílvio Romero, durante uma comemoração de aniversário do bairro. Mas como invejo aqueles que o fazem com maestria, não se importando se estão criando estereótipos. Ah, como os invejo!
Gosto, também, de ir à tarde a uma sessão de cinema, no shopping. Mas, segundo a conceituação agora dada aos idosos, fica ridículo querer ir assistir a nova saga dos tripulantes da Enteprise, ainda que faça isso já há quarenta anos.
Gosto de caminhadas e tenho feito trilhas com mochila às costas; acampei há até pouco tempo, e nunca me importei - ó ignorância minha - se essa era uma atividade reservada aos jovens e ágeis. Claro, juventude de espírito, descobri com aquela leitura na semana passada, é coisa para poetas e loucos, talvez mais estes do que aqueles. Não para pessoas como eu, que agora estão ganhando uma nova consciência de que velhice significa morte em vida. Pelo menos essa foi a lição passada nessa leitura.
Não vou mais tentar compreender Einstein. Não vou mais discutir Freud. O tempo deles, como aprendo agora, já passou. Não cairão totalmente no esquecimento, pois serão lembrados pelo ridículo atróz de persistirem em serem gênios após o seu tempo. Não mais lerei Neruda já que, insidiosamente, tenta nos convencer através de sua autobiografia, que viver vale a pena".

3 Comentários:

  • Às 7:08 AM , Blogger Angela Dal Pos - Morena de Pintas disse...

    Oi, vi o link do blog na comunidade concursos literários e passei para conhecer. Aproveito para convidá-lo para participar da promoção no meu blog e concorrer ao sorteio de um livro. Eu ficaria muito feliz com a visita. www.angeladalpos@blogspot.com
    abraço,
    Angela Dal Pos
    PS. Pelo jeito alguém teve a mesma ideia que eu (risos)

     
  • Às 9:32 AM , Blogger Fabiano Che disse...

    Rapaz... Que texto... Que texto...

    Se um dia eu conseguir escrever uma carta pra um jornal ou revista (quem sabe a Veja) com 10% de sua audacia, ironia e ... talento, posso me considerar um grande escritor...

     
  • Às 1:55 PM , Blogger ... disse...

    O texto original, da Raquel de Queiroz, é mil vezes melhor que o seu, off course. Tantos anos na cabeça e nunca ouviu falar de sarcasmo?

     

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